Ao longo da história, as empresas empregaram vários signos buscando distinguir os serviços e produtos, uns dos outros. Estes signos passaram a ser conhecidos como marcas e o valor econômico que adquiriram tornou necessário que encontrassem proteção sob o amparo da lei. As marcas tradicionais empregam palavras, nomes e letras (nominativas), desenhos, imagens, figuras ou símbolos (figurativas), ou uma combinação de elementos nominativos e figurativos (mistas) para este propósito. O aumento da complexidade da sociedade e do mercado acirraram a concorrência e fizeram com que outros símbolos e/ou elementos passassem a cumprir a função de marca, criando as chamadas marcas não tradicionais.
Em um determinado momento as empresas perceberam que produtos e embalagens com formas diferenciadas poderiam ser trabalhados como marcas, criando uma forte associação na mente do consumidor. Estas formas passaram a ser registradas como marcas tridimensionais. Neste sentido, o Manual de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) define marca tridimensional como o sinal constituído pela forma plástica distintiva em si, capaz de individualizar os produtos ou serviços a que se aplica.
Alguns exemplos de marcas tridimensionais registradas no Brasil são a garrafa da Coca cola e a embalagem de chocolate Toblerone.
Inicialmente é necessário fazer algumas considerações sobre o que é registrável como marca tridimensional. O objeto da proteção é a forma tridimensional de um objeto, mas não é qualquer forma tridimensional que é registrável. O inciso XXI do artigo 124 da Lei da Propriedade Industrial (LPI) determina que não é registrável como marca: “(…) a forma necessária, comum ou vulgar do produto ou de acondicionamento, ou ainda, aquela que não possa ser dissociada de efeito técnico”.
Ou seja, a forma necessária é aquela que é inerente a própria natureza do objeto. Um bom exemplo dado no Manual de Marcas do INPI: a forma esférica para assinalar uma bola de futebol.
No entanto, não se pode esquecer que a proteção marcaria é conformada pelo princípio da especialidade, isto é, a marca é registrada para um determinado ramo de atividade. Se esta forma não permite registro para assinalar bolas de futebol, em tese não haveria qualquer impedimento para assinalar perfumes, por exemplo.
Um requisito essencial para qualquer marca é a distintividade, pois ela deve ser capaz de distinguir produtos ou serviços de outros de origem diversa. Assim, evidente que não se pode admitir o registro de uma forma comum ou vulgar, pois carece de distintividade. A forma distintiva é aquela que se afasta da forma trivial, do padrão do mercado, da forma comumente utilizada para o produto ou embalagem. Abaixo um exemplo de uma forma comum para embalagem de bebidas alcoólicas – irregistrável – confrontada com formas distintivas – registráveis.
A análise de distintividade é realizada sobre a forma tridimensional em si. Isto significa que a aplicação sobre o objeto de padrões ou figuras que em si sejam distintivas, não torna a forma registrável como marca tridimensional. Além dessas figuras não serem consideradas para o deferimento, podem obter o resultado contrário, se por exemplo forem reprodução ou imitação de marca alheia ou caírem em quaisquer das proibições legais para registro de marca. Abaixo vemos um exemplo de uma garrafa comum com rótulo distintivo. O que está no rótulo poderia ser objeto de uma marca figurativa ou mista, mas não será considerado na aferição de distintividade da forma da garrafa.
Outra barreira para o registro de uma marca tridimensional é a forma que não pode ser dissociada de efeito técnico. Em outros termos, é a forma caracterizada apenas pela função técnica que realiza, ou que é imprescindível para alcançar um efeito técnico. Não significa que o objeto não pode ter uma finalidade prática, ou que a forma não pode almejar um efeito técnico, significa que a essencialidade da forma não pode ser separada da sua funcionalidade.
O fundamento para esta proibição é que a concessão de uma marca nestes moldes acabaria indiretamente por proteger características técnicas, que somente poderiam ser protegidas por patente. Isto representa uma grave distorção no sistema de propriedade industrial, uma vez que a patente concede uma exclusividade apenas temporária, visando incentivar investimento em inovação tecnológica. O título permite ao inventor se apropriar do valor econômico do que criou por um período considerado justo, no entanto, após o prazo de vigência da patente, a matéria cai em domínio público para ser aproveitada por toda a sociedade. Já a lógica das marcas é diversa, pois visam proteger os investimentos do titular na qualidade e a reputação da empresa, promovendo a concorrência e beneficiando o consumidor. Então a marca deve ser mantida enquanto a empresa durar, bastando que o registro seja renovado sucessivamente. A forma técnica protegida como marca desvirtua o instituto da patente, permitindo a proteção permanente de algo que deve ser temporário.
Um exemplo interessante de uma forma considerada necessária para obter um efeito técnico vem da Alemanha, em que foi anulada a marca tridimensional das cápsulas de café Nespresso, registrada para café, extratos e preparações de café. Apesar de a forma desta cápsula ser provavelmente vinculada com a Nestle, é inegavelmente uma forma “must-match” ou obrigatória, determinada pela forma do compartimento em que é recebida e pelo modo como deve fornecer seu conteúdo à máquina para realizar sua função. Ou seja, o desenho é todo determinado pela funcionalidade e seu registro como marca tem o potencial de impedir que outras empresas fabriquem máquinas de café e cápsulas com a mesma tecnologia.
Outra proibição constante no artigo 124 inciso XXII da LPI diz respeito a objeto que estiver protegido por registro de desenho industrial de terceiro. Evidente que ninguém pode se apropriar através de registro de marca de uma forma que não lhe pertence, desenvolvida e registrada como desenho industrial por outro. No entanto, nada impede que registre como marca tridimensional os seus próprios registros de DI, contanto que satisfaçam os requisitos legais para a proteção.
Por fim, a marca tridimensional está sujeita também a proibição genérica de registro de sinal contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou imagem de pessoas ou ainda, atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou ideia e sentimento dignos de respeito e veneração. É difícil acontecer, mas um exemplo poderia ser a tentativa de registro como marca de uma mesa em forma de suástica nazista.
O registro de marca tridimensional é algo complexo, tanto no Brasil como no exterior, mas nossa equipe especializada está a sua disposição para analisar a viabilidade do registro de seus produtos e embalagens como marca tridimensional, depositar e acompanhar o pedido em qualquer país. Consulte-nos.
Adriano Marcelo Gazzola Bedin
Mestre em Direito da Empresa e dos Negócios
Advogado em Propriedade Industrial
Agente da Propriedade Industrial